Ao final, requer a concessão da segurança e o reconhecimento do direito de compensação dos valores pagos indevidamente.
Informações prestadas pela autoridade impetrada (id 992537).
O MPF manifestou seu desinteresse no feito (id 1278025).
Vieram os autos conclusos à apreciação.
É o relatório. Decido.
De início, observo que a questão relativa à inclusão ou não do ICMS no conceito de faturamento foi, de fato, apreciada na Suprema Corte, no Recurso Extraordinário nº 574.706, com
repercussão geral reconhecida, cuja notícia do julgamento, de 15/03/2017, trilha no sentido da impossibilidade de cômputo do valor do ICMS na base de cálculo do PIS e COFINS.
Nada obstante tal decisão não ter sido ainda publicada, foi ela noticiada pelo STF em seu informativo de jurisprudência (nº 857). Assim, embora ainda não seja vinculante, já não pode ser
ignorada.
Contudo, não se pode perder de vista que houve verdadeira “evolução jurisprudencial”, uma vez que há muito já restava assentado que o ICMS deveria ser incluído no conceito de
faturamento e de receita bruta.
De fato, a Lei Complementar 7/70 previa, em seu artigo 3º, que a empresa contribuiria para o fundo do PIS com recursos próprios “calculados com base no faturamento.”
E ainda antes da Constituição Federal de outubro de 1988 o tribunal então competente para análise da legislação tributária federal, o Tribunal Federal de Recursos (TFR), já havia
consolidado o entendimento de que o ICM deveria ser incluído na base de cálculo do PIS, ou seja, ele compunha o faturamento da empresa.
A Súmula 258 do TFR, de junho de 1988, deixou consignado:
“Inclui-se na base de cálculo do PIS a parcela relativa ao ICM.”
Poucos dias depois foi promulgada a Constituição Federal de 1988 que, além de manter a cobrança do PIS nos termos da LC 7/70, conforme artigo 239 da CF/88, previu a cobrança de
contribuição sobre o faturamento (art. 195).
Ora, não se pode presumir que o constituinte originário não tinha conhecimento do conceito de faturamento utilizado na seara tributária e de que tal conceito estava assentado no âmbito do
Poder Judiciário da época, no sentido de que o ICM fazia parte de faturamento.
E o Superior Tribunal de Justiça abonou o entendimento então vigente – agasalho à época pelos três Poderes – confirmando que “A parcela relativa ao ICM inclui-se na base de cálculo
do PIS”, conforme sua Súmula nº 68.
Reforçando ainda mais a posição adotada em favor da interpretação então vigente, o Superior Tribunal de Justiça também consolidou a jurisprudência no sentido de que “A parcela relativa
ao ICMS inclui-se na base de cálculo do FINSOCIAL”, conforme Súmula nº 94.
Lembro que o Finsocial incidia sobre a receita bruta das empresas, nos termos do artigo 1º, § 1º, do DL 1.940/82, restando equiparados os conceitos de receita bruta e faturamento para
fins tributários.
O mesmo entendimento aplica-se à Cofins, por se tratar de contribuição instituída pela LC nº 70/91 em substituição ao Finsocial.
E no RE 582461, no qual o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da inclusão do ICMS na sua própria base de cálculo, extrai-se do voto da Ministra Ellen Grace que
“não há uma garantia constitucional genérica contra a sobreposição de tributos, o que foi destacado pelo Ministro Ilmar Galvão ainda no RE 212.209”, concluindo a Ministra que “Efetivamente, a
instituição de impostos retrata a riqueza em determinada perspectiva, não havendo direito a que os impostos incidam sobre um riqueza líquida, depurada de quaisquer ônus tributários”.
Anoto, ainda, que no ADC 1, o Ministro Carlos Veloso havia resolvido – no âmbito da Suprema Corte - a questão relativa a inclusão do ICMS no conceito de faturamento de forma
definitiva:
“Em alguns memoriais fala-se, também, que haveria inconstitucionalidade em razão de o ICMS integrar a base de cálculo da COFINS. Assim, deveria esta Corte excluir o ICMS da base de
cálculo da COFINS. A questão, no ponto, entretanto, diz respeito ao conceito de faturamento, o que não ostenta as galas de questão constitucional. Assim, esse argumento não é matéria que possa
ser discutida na ação declaratória de inconstitucionalidade, dado que se trata de questão infraconstitucional.” (grifei).
Assim, a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS implica mudança do conceito de faturamento e receita bruta há muito firmado, implicando inclusive mutação
constitucional, haja vista – como dito ao início – que não se pode presumir que o constituinte originário desconhecesse a jurisprudência consolidada em 1988, no sentido de que o ICM estava
incluído no conceito de faturamento, pois tal imposto está embutido no preço da mercadoria.
Tratando-se de “evolução dos conceitos”, decorrente das transformações sociais no tempo, somente pode surtir efeitos contrários a quem sempre atuou de acordo com a definição
anteriormente agasalhada pelo ordenamento jurídico a partir da declaração de tal “evolução”.
Uma tal interpretação guarda semelhança com a interpretação constitucional evolutiva de que fala o Ministro Luis Roberto Barroso, que inclusive menciona sua obra “As normas, ensina
Miguel Reale, valem em razão da realidade de que participam, adquirindo novos sentidos ou significados, mesmo quando mantidas inalteradas as suas estruturas formais.” (Interpretação e Aplicação
da Constituição, p.146).
E foi o que aconteceu no caso, uma vez que o Supremo Tribunal Federal apresentou verdadeira evolução interpretativa, ao passar chamar de “meros ingressos” parte do que antes era a
receita bruta (no caso o valor do ICMS).
Em outras palavras, não é cabível o reconhecimento de ilegalidade em momento anterior ao julgamento do STF, de 15/03/2017, do RE 574.706, pois foi nesse momento que houve a
efetiva mudança da jurisprudência do STF, razão pela qual não há direito a suspensão de exigibilidade de crédito tributário ou mesmo a qualquer indébito de período anterior a tal data, relativo a
recolhimento do PIS e Cofins incidente sobre o valor do ICMS das vendas.
Registro que as alterações advindas pela Lei 12.973/14, nas Leis 9.718/98, 10.637/02, 10.833/03 e no DL 1598/77, em nada alteram a questão relativa à receita bruta, faturamento e
inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.
Por fim, anoto que eventual pagamento a maior referente às contribuições ao PIS e Cofins a partir da competência março de 2017, conforme acima delineado, somente é passível de
compensação após o trânsito em julgado, nos termos do artigo 170-A do Código Tributário Nacional, e observado o disposto no artigo 74 da Lei 9.430, de 1996, com o acréscimo do índice
correspondente à taxa Selic, conforme artigo 39, § 4º, da Lei 9.250/95, não sendo o caso, então, de concessão de liminar nesse sentido.
Dispositivo
Ante todo o exposto, CONCEDO parcialmente a SEGURANÇA, para i) declarar a inexigibilidade da inclusão do valor do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, a partir de
15/03/2017; e ii) declarar o direito de a impetrante compensar, se quiser, os valores eventualmente recolhidos a esse título, também a partir de 15/03/2017, observada a necessidade do trânsito em
julgado, acrescidos dos juros equivalente à taxa Selic desde o recolhimento.
Deverá ser observado o disposto no art. 14, § 3º, da Lei nº 12.016/2009.
Descabe condenação em honorários advocatícios, nos termos do artigo 25 da Lei n. 12.016/2009.
Custas na forma da lei.
Após o trânsito em julgado, e cumpridas as cautelas de praxe, arquivem-se.
P.R.I.
JUNDIAí, 12 de julho de 2017.
Dr. JOSÉ EDUARDO DE ALMEIDA LEONEL FERREIRA - JUIZ FEDERAL
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 17/07/2017
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